30 agosto 2006

PAU-BRASIL

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O jovem riu-se e começou a desapertar o colar que usava ao pescoço. Desenfiou, então, uma das conchas, voltou a apertar o colar e lançou para a areia a conta retirada.
- Que estás a fazer? - perguntou Colombe.
- Hoje é dia de lua cheia - respondeu o jovem, com toda a naturalidade -, tenho de tirar uma conta do meu colar.
- Karaya é um prisioneiro - esclareceu um dos guerreiros, rindo-se. - Em cada lua, uma conta a menos; quando se acabarem as contas comemo-lo.
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Pau-Brasil, Jean-Christophe Rufin


Em 1555, à frente de uma armada de 3 navios e 600 homens, entre soldados e colonos, Nicolas Durand de Villegaignon, Vice-almirante da Normandia, parte do Porto Francês de Le Havre rumo ao Brasil. Tem um sonho: fundar uma colónia na América do Sul – a França Antárctica.
Após uma difícil viagem, a armada penetrou na baía de Guanabara, aportou a uma das suas ilhas e aí construiu um forte: Forte Coligny em honra de Gaspar de Coligny, patrocinador da empresa.
Fruto das privações dos colonos, inflamadas pelo carácter rude e autoritário de Villegaignon, a colónia começa a passar por dificuldades. Dois anos depois da chegada um novo carregamento de colonos chega da Europa, essencialmente Calvinistas Suíços.
A colónia é agora uma babel de tendências religiosas: há católicos, luteranos, calvinistas, huguenotes e, até, anabaptistas. Cada grupo vigiava todos os outros que considerava hostis. Estas lutas internas iam desviando os residentes do essencial e a construção da colónia ia sendo negligenciada.
O sonho da França Antárctica não durou mais do que uma dúzia de anos. Em 1567, já Villegaignon tinha regressado a França, os Franceses são, definitivamente, expulsos por Mem de Sá, com a ajuda de seu sobrinho Estácio de Sá, fundador da cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro, que viria a perder a vida no assalto.
Baseado neste facto histórico pouco conhecido Jean-Christiphe Rufin escreveu Pau-Brasil.
Guiados por duas das crianças embarcadas na expedição para aprenderem a língua dos selvagens e, deste modo, servirem de intérpretes, entre os autóctones e os colonizadores, somos levados a viver uma aventura extraordinária por terras desconhecidas.
Just, o mais velho, chegará a braço direito de Villegagnon depois de iniciado por este na nobre arte da guerra. Colombe, a mais nova, que embarcará disfarçada de rapaz por ser absolutamente proibido o embarque de mulheres, tornar-se-á, por vontade própria, um elemento de uma tribo de canibais: “gostavam dos filhos, dos pais, da tribo, do sol e das árvores favoráveis, gostavam da água das cascatas e do vento tépido das praias, gostavam da terra que satisfaz as necessidades humanas, gostavam da noite e do dia, do fogo e do sal, da avestruz e do tapir. E, nesta trama apertada de amor e medo, não estava previsto que um só ser se apoderasse de tudo em seu benefício”.
Pelo meio assistimos à penosa travessia do Atlântico, à dolorosa construção do Forte Coligny, às intestinas lutas entre facções religiosas, às crueldades de Villegaignon para impor a lei e a ordem na colónia, ao penoso encontro de civilizações até ao desfecho, ainda que um tanto cinematográfico, em que os Portugueses, finalmente, expulsam os Franceses.
Jean-Christiphe Rufin escreveu um belo romance. Em 2001, Pau-Brasil, seria agraciado com o Prémio Goncourt.

1 comentário:

Tozé Franco disse...

Pela apresentação feita a coisa promete...
Um abraço.